terça-feira, 2 de setembro de 2008

RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR AÉREO

Sempre defendi a tese que o Direito é uma área onde constantemente alguém vai ter uma opinião sobre um determinado tema, gerando entre confusões, novas teses e debates interessantes. A responsabilidade civil do transportador aéreo vem sendo bastante discutida, especialmente devido aos últimos acontecimentos na aviação comercial brasileira e mundial.

A crise no setor, devido ao elevado preço do barril de petróleo, tem feito empresas no mundo todo reduzir custos operacionais, bem como cortando rotas não-lucrativas e aviões mais antigos da frota, na tentativa de não fechar as portas. O problema reside justamente nesta eterna busca pelo menor gasto, que pode sair mais caro depois. Um exemplo é o vôo da Tam, em Congonhas no ano passado e o da Spanair, este ano em Madrid, aviões que decolaram ou tentaram com problemas, e o pior é que o passageiro lá dentro, nem imagina.

O Brasil é signatário da Convenção de Varsóvia, onde o Código Brasileiro de Aeronáutica de 1986 (CBA) segue os ditames deste tratado internacional. Noutra senda, há o Código de Defesa do Consumidor (CDC), de 1990 que rege todas as relações de consumo no país. Razão pela qual chamo atenção ao início da discussão: todos querem opinar quando há uma matéria de Direito. Ainda bem que há os Tribunais Federais, para acabar com esta bagunça, então o Superior Tribunal de Justiça (STJ), pacificou em suas jurisprudências que a empresa aérea (seja de carga ou passageiros) é um fornecedor de serviços, desta forma, devendo se aplicar o CDC.

Daí surge um novo questionamento: Por que aplicar o Código de Defesa do Consumidor, que é uma norma geral para toda forma de relação de consumo, se há um Código Brasileiro de Aeronáutica regendo em específico às normas da aviação brasileira? Simples, recorrendo à lei de introdução ao nosso Código Civil, fica claro que o CDC, de 1990, uma vez caracterizada a relação de consumo entre a empresa aérea e o cliente, revoga automaticamente os Decretos referentes ao Código de Varsóvia, bem como o CBA, por serem normas anteriores à vigência do CDC. Então, da próxima vez que alguém ousar alegar que não há uma relação de consumo ou aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor para a reparação de eventuais danos, tais quais desastres, overbooking, extravio de bagagens, atrasos em vôos, fique tranqüilo, o STJ já consolidou este entendimento da responsabilidade do transportador aéreo.

Por fim, uma ironia acontece ao julgador. Ao aplicar o Código de Defesa do Consumidor, para punir a empresa que não prestou o serviço de forma eficaz, segura e correta, havendo alguma forma de vício em sua atividade, o quantum indenizatório é baseado pela convenção varsoviana, que seria uma responsabilidade limitada, pelo simples fato de o transportador aéreo conviver com vários riscos (próprios da atividade), bem como a compra de aeronaves e manutenção, que geralmente são altíssimos, geralmente em dólares (imaginem quando o câmbio não era favorável), onde altos valores indenizatórios poderiam levar à falência imediata do empresário, comprometendo inclusive a integração nacional, de um país continental como o Brasil e afetando ainda a concorrência.

Talvez o capitalismo selvagem, aliado à vontade de lucrar sem limites, tenha feito o empresário esquecer a importância da atividade para uma nação, bem como o que está sendo transportado, que são vidas, onde apenas a segurança é o importante. Alguns anos atrás, a China era um país recordista em acidentes e incidentes aéreos, razão pela qual o governo local fez normas mais rígidas e algumas empresas que não faziam a devida manutenção ou colocavam no ar aviões com algum problema, levavam uma multa altíssima, bem como tinha o direito de comprar novas aeronaves caçado. O reflexo é percebido hoje, como um dos países mais seguros para se voar. Talvez uma nova Convenção Internacional, mais rígida, fosse a solução para uma maior segurança em tempos de crise.

2 comentários:

Girley Brazileiro disse...

Parabéns filho,
Você vem tratando de temas polemicos, com simplicidade e conhecimento.
Seu pai Girley

Nina disse...

Parabéns Tico! Muito bom teu texto... um dos melhores. Matou a pau. Beijos, Nina.